sexta-feira, 1 de julho de 2011

MATADOURO DE PEIXINHOS


Virgínia Barbosa
Bibliotecária da
Fundação Joaquim Nabuco
"Esta terra banhada em sangue de animais, suor de homens,
não será mais matadouro posto que
doravante será o Nascedouro da Cultura Popular [...]"
(poeta Oriosvaldo Limeira de Almeida)
 

Segundo Pereira da Costa, já na época da dominação holandesa em Pernambuco, há notícias sobre um curral, onde haveria matança de gado, talvez a origem de um “matadouro” no Recife. Em documento legal de um terreno para a Igreja de São José de Ribamar, de 1752, existe a informação de que essa área ficava situada “no campo do curral, junto à cacimba chamada de Cajueiro”, nas proximidades do atual Forte das Cinco Pontas.
Do século XVI ao XVII, existiram no Recife alguns currais e matadouros públicos e particulares. Sabe-se, inclusive, que, em 1824, o governo comprou de Elias Coelho Cintra um terreno, situado no extremo sul do bairro da Boa Vista, à época denominado Curtume do Coelho ou Sítio dos Coelhos, para servir de matadouro geral para os açougues do Recife, Boa Vista e Afogados. Nos fundos da capela de São Gonçalo haviam também matadouros particulares. Outros currais de gado presentes no areal das Cinco Pontas foram transferidos para a Cabanga, por decisão da Câmara Municipal, em 1831, ano em que ficaram estabelecidas regras sobre a matança do gado, a venda da carne nos açougues públicos e particulares, o itinerário e a hora de entrada na cidade das boiadas que vinham do interior.
A mudança de endereço dos currais de gado teve que esperar até 1844, quando através da Lei Provincial nº 135, foi autorizado empréstimo e escolhido o local – o areal das Cinco Pontas – para a construção de um matadouro público e logradouro para o gado. O projeto foi do engenheiro coordenador da Câmara Municipal, Antônio Feliciano Rodrigues Sete, mas por causa da impropriedade do local – alagamento quando da maré cheia –, o projeto não vingou.
Em 1855, ficou estabelecido pela mesma Câmara a construção do matadouro na Cabanga, quase no extremo sul da rua Imperial. Neste mesmo ano, em 26 de agosto, foi realizado o primeiro abatimento de gado. Nos terrenos do areal das Cinco Pontas, onde funcionavam o matadouro e os currais, foi construída a estação central da estada de ferro do Recife ao São Francisco, cujos trabalhos foram inaugurados a 7 de setembro de 1855.
O matadouro construído na Cabanga funcionou até 1919 quando foi transferido para um novo local à margem do rio Beberibe, limite dos municípios do Recife e Olinda, no bairro de Peixinhos. Diz-se que esta denominação – Peixinhos – foi dada pelos primeiros moradores do local que se reportavam a um rio que era utilizado tanto para lavar roupas, tomar banho quanto para pescar peixinhos, que haviam em grande quantidade. Mesmo depois de identificarem esse rio como Beberibe, a referência ao “rio de peixinhos” já fazia parte do imaginário dos moradores do local.
O período de construção desse novo matadouro foi de dezembro de 1912 a 19 de novembro de 1919. Entretanto, sabe-se que, em 1874, foi assentada a sua pedra fundamental e existem informações que, daquele ano até 1912, foi feito mais de um contrato para erguê-lo, mas nenhum deles foi cumprido.
O primeiro passo para o seu estabelecimento foi dado pelo prefeito Archimedes de Oliveira (gestão de 1908 a 1911), quando fechou contrato com o engenheiro civil e bacharel em Direito Joaquim José de Almeida Pernambuco. O edifício era composto de: pavilhão da diretoria, hall de circulação, de matança de gado graúdo e miúdo, hall de matança de porcos, instalações frigoríficas, seção sanitária, oficina de limpeza, sala para preparo de fressuras (conjunto das vísceras mais grossas de alguns animais), salsicharia, forno e crematório, tudo abrigado em 15 blocos. O material utilizado na sua construção foi importado: o ferro veio da França e serviu para formar a estrutura de coberta; os azulejos que cobriam todas as paredes, as telhas e os vidros vieram da Europa. A sua construção bem como a da Fábrica Fosforita Olinda S/A, em 1957, atraiu um grande número de trabalhadores, o que deu origem à população de Peixinhos.
Na década de 1970, há quase meio século de sua inauguração, o governo do estado de Pernambuco desativou o Matadouro de Peixinhos alegando descumprimento das normas para o seu funcionamento, exigidas pelo governo federal em todo o território nacional. Sua desativação provocou desemprego e muito prejuízo sócio-econômico à comunidade de Peixinhos. Inclusive, o local transformou-se num ponto de tráfico de drogas, violência e morte, até que, no início dos anos 1990, vários grupos culturais da comunidade iniciaram o resgate daquele espaço.
Por decreto municipal de 1980, assinado pelo prefeito Gustavo Krause, o Matadouro se tornou sítio histórico. Logo após, a Prefeitura transformou parte daquele estabelecimento em um Centro Social Urbano, que foi instalado em 1982, com o objetivo de atender necessidades sociais da comunidade.
Na gestão do prefeito Joaquim Francisco de Freitas Cavalcanti, em 1985, grande parte da estrutura do Matadouro de Peixinhos foi demolida para surpresa dos moradores do bairro. A denuncia e o apelo de vários segmentos da sociedade conseguiu interromper a ação da Prefeitura, entretanto, poucos blocos ficaram de pé e toneladas de ferro foram retiradas e vendidas.
Em 17 de março de 2006, foi inaugurado, com a presença de autoridades e do público em geral, o Centro Cultural Desportivo Nascedouro de Peixinhos que faz parte das ações do Programa de Infra-Estrutura para Áreas de Baixa Renda da Região Metropolitana do Recife realizadas em parceria com o governo do Estado e as prefeituras do Recife e de Olinda para implementar obras urbanas que se estenderão a toda a bacia do rio Beberibe. O Centro Cultural foi fruto principalmente da luta da comunidade que, além de reivindicar a revitalização das instalações do antigo matadouro, clamava pela transformação daqueles espaços para atividades sócio-culturais.
Em sua totalidade, o projeto do Centro Cultural compreende auditório, vestiário, recuperação do campo de futebol, da caixa d’água localizada numa torre e da escadaria de acesso ao seu topo, a construção da quadra poliesportiva e a implantação de playground. Em 23 de maio de 2008 foi inaugurado pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos, o Centro Tecnológico de Cultura Digital de Peixinhos (CTCD) que irá oferecer cursos técnicos e de qualificação gratuitos em áudio, rádio, TV/Vídeo, Design Gráfico, programação e metareciclagem, propiciando melhor qualificação profissional para jovens e adultos e maiores perspectivas de emprego.
Desde a sua inauguração, em 2006, o Centro Cultural Desportivo Nascedouro de Peixinhos tem abrigado diversas atividades e manifestações culturais.

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